quarta-feira, 30 de junho de 2010

o futebol sempre foi uma caixinha de surpresas. o montinho artilheiro, o juiz ladrão, o juiz burro, o bandeirinha cego, o gol de mão, o sobrenatural de almeida, a mula sem cabeça e sei lá mais o que. no futebol os vacilos nunca são perdoados, e um time bem determinado tem sempre boas chances surpreender a equipe favorita. no futebol todos sabem que é impossível que não haja torcedores insatisfeitos com a atuação dos árbitros e sabem que é impossível que todos os lances sejam enxergados corretamente e que não haja nenhum erro. resta torcer pra que os erros sejam a nosso favor. tudo isso sempre foi parte inseparável do esporte. tem graça. é relativamente nova essa vontade da mídia em repudiar os erros de arbitragem e exigirem que o futebol se torne asséptico, estéril e teoricamente perfeito e infalível, como no mundo ideal de luz e cor vendido pelo império americano e pelas televisões. querem tempos técnicos, tempo da tv, replays digitais, mais alguns árbitros, um monte de coisas. já conhecemos a história. nelson rodrigues defendia a natureza do futebol e argumentava que o replay era burro. vai uma dele.


A INVISIBILIDADE DO ÓBIVO
nelson rodrigues, o globo 26/10/1968

eu ia começar esta crônica dizendo o que mesmo? ia dizer que nada mais antigo que o passado recente. perdão. não é bem isso. ah, agora me lembro. o que eu queria dizer é que ninguém enxerga o óbvio. poderão objetar que já escrevi isso umas duzentas vezes.ai de mim, ai de mim. não sinto nenhum escrúpulo, nenhum pudor em me repetir. hoje, porém, tenho uma  variação. direi  que o óbvio  não é só invisível, mas  detestável.
a toda hora e em toda parte, encontramos inimigos ferozes do óbvio. um deles é o nosso armando marques, o maior juiz de futebol brasileiro. vocês conhecem o episódio. no último fla-flu, o ponta tricolor wilson recebeu um lançamento em profundidade. o garoto corre mais que um coelhinho de desenho animado, conseguiu bater o marcador, ultrapassá-lo em sua velocidade fulminante. por desgraça o goleiro adversário saiu antes e ia agarrar a bola.
wilton usou a mão e tirou-lhe a bola. perfeito lance de basquete. a falta foi de um óbvio tão ululante que armando marques não viu. e o nosso extreminha pôde, com sublime descaro, enfiar a bola no fundo das redes. ora, o nosso melhor árbitro ganha doze milhões antigos. é um salário de walter moreira salles. e ninguém entendeu que, tão bem pago, armando marques fosse cego, surdo e mudo para a evidência estarrecedora.
houve quem insinuasse duas hipóteses: - ou má-fé ou incompetência. nem uma coisa, nem outra. a competência ou a boa-fé de armando marques está acima de qualquer dúvida ou sofisma. portanto, só uma coisa o justifica e absolve: - a invisibilidade do óbvio.

* fluminense 1 x 0 flamengo, 13/10/1968, maracanã.

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